Newsletter 01/02

De quem são as Olimpíadas?

Fonte: Blog do Erich Beting

A pergunta é recorrente. E voltou à tona nesta semana, após polêmica que chegou à mídia, mas que já circulava no meio acadêmico um pouco antes. Afinal, os Jogos Olímpicos têm um dono? E esse dono, o que pode fazer para preservar seus direitos?

A professora Kátia Rubio, da Universidade de São Paulo (USP), recebeu uma notificação em que é proibida de permitir a circulação do seu livro “Esporte, Educação e Valores Olímpicos”. O autor da carta pedindo o bloqueio da venda dos exemplares foi o Comitê Olímpico Brasileiro (COB). A justificativa dada pelo COB é de que a autora usa indevidamente os termos “olímpico” e “olimpíadas” durante o livro, além de usar os anéis olímpicos sem a autorização do Comitê Olímpico Internacional (COI).

A gritaria começou. O principal motivo é a alegação de que é um absurdo não se permitir o uso até mesmo da palavra “Olimpíadas” e suas variações para uma obra literária. Ainda mais se, a cada momento, vemos os meios de comunicação usarem o termo e não serem repreendidos para tal.

A situação revela um caso peculiar da gestão do esporte no mundo. O forte apelo popular que ele traz faz com que haja aquela sensação de certa “liberdade” em relação aos direitos de veiculação e uso de propriedades que, na verdade, têm um dono.

Desde a década de 80, os Jogos Olímpicos passaram por um processo de fortalecimento para ser o evento esportivo mais valioso do mundo. Hoje, as Olimpíadas são um fenômeno de reunião de pessoas e de empresas patrocinadoras. E isso, sem dúvida, graças ao trabalho feito pelo COI para valorizar a marca dos seus Jogos.

Só que, para atingir isso, o COI adotou uma estratégia absolutamente radical em relação à preservação de seus direitos. A partir da Carta Olímpica, o comitê decidiu que não seria permitida qualquer associação aos Jogos por parte de pessoas e/ou empresas que não fossem parceiras comerciais da entidade. E, desde então, existe essa caçada a qualquer tipo de publicação que use o termo para vender alguma coisa, até mesmo um livro.

Do ponto de vista da construção de marca do COI, a estratégia é correta. Por mais que haja toda a história dos Jogos, formada em sua origem pelos atletas e também pelos torcedores, atualmente é o comitê quem tem de arcar com toda a organização do evento.

Ou seja. As Olimpíadas têm um dono, que é o COI.

Por isso mesmo, toda e qualquer ação que tenha como objetivo se apropriar de algo relacionado aos Jogos Olímpicos têm de passar pelo crivo do comitê, que usa suas entidades filiadas (são mais de 200 comitês locais) para garantir a preservação desses direitos. É, mais ou menos, como a Coca-Cola, que tenta de todas as formas combater o uso indevido de sua marca e de seu nome. A diferença é que a Coca não conseguiu, até hoje, impedir que outras empresas usem o termo “refrigerante de cola”, algo que o COI obteve com os derivativos de Jogos Olímpicos (Olimpíadas, olímpico, etc.).

Deixar passar algo assim não é algo que o COI costuma fazer. E, atualmente, a coisa fica ainda mais séria aqui no Brasil por dois motivos.

O primeiro, claro, é a realização dos Jogos em 2016. Para dar mais segurança ao comitê internacional de que o país está preparado, o COB com essa atitude mostra que está atento a qualquer coisa que se faça “contra” a preservação da pureza das Olimpíadas.

O outro motivo, também evidente, é financeiro. Desde os Jogos Pan-Americanos de 2007 que o COB criou uma editora para lançamento de livros cujo tema é os esportes olímpicos. Ou seja: um livro que debata Olimpíadas sem o seu selo é dinheiro perdido…

Caberá à Justiça dizer o que pode ou não pode. Mundialmente, a causa é sempre dada em favor do COI, com raras exceções. Como o Brasil já aprovou, no ano passado, diversas leis para proteger os Jogos Olímpicos e o COI até 2016, o caso poderá significar uma quebra de barreiras na literatura sobre Olimpíadas no país.

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